quinta-feira, 23 de maio de 2019

Gastão

Mal se encontram palavras para explicar a tristeza de perder um amigo de 4 patas. As fotografias - alguns dos inúmeros momentos captados ao longo destes 10 anos, na sua companhia -, foram tiradas pelo dono, meu marido, e por mim. A música é um tema original composto pelo próprio (dono), há 2 anos: Passo de Gastão: a linha do baixo a lembrar os passos pesados e bamboleantes deste cãozarrão incrível, que por vezes lembrava um pequeno urso, outras um belo lobo de orelhas arrumadas em baixo. Ficam as memórias. Mas a tristeza de o seu tempo ter chegado ao fim é imensa. Pela casa, em cada canto, nos gestos da nossa rotina, está a força da sua  ausência. Este novo e estranho silêncio, a que teremos de nos habituar. Hoje o carteiro passou e fez falta, a imponência da tua indignação, Gastãozola, o teu corpanzil a correr de um lado ao outro da casa, a ralhar com aquele homem atrevido, que regularmente aqui passa de mota, grande parte das vezes para deixar contas e recados oficiais antipáticos; tinhas toda a razão, pois tão raro é hoje em dia chegar pelo correio algo gentil para a alma, como cartas manuscritas, um postal, um presente, um livro. Guardavas a nossa casa, uma sentinela atenta, mas pousavas a cabeçorra sobre a mesa de jantar ou nas nossas pernas, a pedir 'pãozinho', a palavra mágica. A 'manita di plata', a namorar o petisco. Os olhos castanhos enormes, para cá e para lá, a explicar: 'é aquilo ali que eu quero, ali, ó'. Uivavas sentado no cimo das escadas do terraço, só porque sim, e eu chamava-te 'cãotor'. Uivavas em casa quando o dono começava a estudar saxofone, para te juntares em dueto, às primeiras notas. Além da mania de sacar guardanapos, que mastigavas e comias, gostavas de roubar o nosso chinelo do pé ou ir apanhar o sapato mais à mão, para mostrar que estavas contente por nos ver de manhã ou por entrar em casa - ninguém te ensinou esse truque, era uma arte só tua. Nos anos vividos em todo o teu esplendor, entravas em casa a atirar com a porta, para desatar a correr escada- acima-escada-abaixo, a contornar os móveis como podias, e lá vou eu outra vez galgando degraus e reaparecendo para nova corrida, alegria pura de viver. Adormecias naquela posição como que de corpo desarticulado, uma espécie de coreografia do Lago dos Cisnes, e fazias-nos sorrir e enternecer quando, à nossa passagem, esticavas a patorra para nos deter ou pedir festas e massagens. Quando fazias asneira, de pouco ou nada servia ralhar contigo: a personalidade era muita em ti, parente de lobo; olhavas impávido, como quem explica, 'roubei porque te distraíste, não tenho culpa'. Um dia foram 3 farinheiras de uma feijoada; noutro, um pedaço de queijo da serra. Como larápio tinhas bom gosto, é preciso admitir. Pela casa novelos do teu casaco em constante renovação, com o passar das estações. Vou varrendo a casa e despedindo-me de ti. Por muito tempo ainda darás um ar de tua graça em recantos mais escondidos, em mantas de lã, nas nossas peúgas e camisolas, em todas as peças de roupa. Um serra da estrela de pêlo comprido: um compromisso e uma batalha perdida. E agora olha, vou perdendo os vestígios de ti, a cada dia. As memórias agarro, essas não me fogem. 
Eras bonito e elegante, com o teu 'casa-cão', assustador para os intrusos e meigo com os amigos da casa. Perfeito, portanto. 
 Adeus, querido Gastão. Obrigada pelos anos que nos deste.
Música e execução: Nanã Sousa Dias

quarta-feira, 22 de maio de 2019

Prémio Camões

Ao contrário da minha reação quanto ao Nobel dado a Bob Dylan, em 2016, fico feliz com o Prémio Camões atribuído a Chico Buarque. Este sim, tem feito muito pela língua e literatura lusófona. Considerando a sua vasta obra poética e de prosa, a mestria nos jogos de palavras, no efeito poético, no poder narrativo, na riqueza de vocabulário, sensibilidade, enfim, tanto haveria a dizer sobre a sua escrita, é mais que merecido. Muitos parabéns, Chico!

domingo, 5 de maio de 2019

The Durrells

Hoje, no Dia da Mãe, regresso a este meu canto para partilhar convosco uma série imperdível, a passar aos Domingos na RTP2. Haverá sempre mil pretextos para dizer ou pensar: A minha Mãe ia adorar isto. Um abraço apertado, Mãe, onde quer que esteja. Vejo, encanto-me e rio com cada episódio e olho para o lado, como se tivesse, pousado no ombro, um anjo qualquer, que lhe leva notícias daqui.