sexta-feira, 29 de abril de 2011

Apesar de tudo

Apesar da chuva, dos relâmpagos e travões,
Apesar dos carros atolados em estradas e rotundas
Apesar de ter andado meia perdida pelos caminhos

Cheguei a casa sã e salva

Apesar de ter um Renault twingo benetton
Apesar de ele não ser um submarino
Apesar de o ter feito atravessar verdadeiros lagos
Feitos de chuvas repentinas

O meu carrito não se afogou nem se perdeu, e levou-me sã e salva até casa

Apesar da crise
Apesar da chuva
Apesar de todos os "se's" que nos servem de travão ou marcha-atrás

É preciso ir, insistir, não desistir

Apesar de não as vermos tanto como queríamos
Apesar de a vida, muitas vezes, não nos deixar

Encontramos pessoas que nos dão um chapéu de chuva
Um casaco, um abraço, um abrigo
Como se fosse ontem, hoje, sempre
E nos dizem "Fica aqui até a chuva passar"

E por isso chegamos a casa sãos e salvos
Apesar de tudo

Os livros são como essas pessoas melhores que temos na vida.

Os que não esquecemos, apesar do pó
Os que amamos sempre, apesar de não os lermos todos os dias
Aqueles aos quais pedimos socorro, quando buscamos salvação na tempestade.

Apesar do pouco dinheiro no bolso
Apesar do desespero
Apesar da preguiça

E porque, apesar da chuva, existem os livros, é preciso visitar a Feira do Livro de Lisboa, conhecer os autores, os novos espaços lúdicos, trazer livros autografados com dois dedos de conversa, conhecer gente que ama os livros como nós.

Apesar de ser Abril e de o ditado popular não ter sido esquecido
Apesar de não dar jeito nenhum

A feira do Livro vale a pena

Apesar de tudo

SITE DA FEIRA AQUI

Os sentidos na infância

SABORES/TACTO
Os chocolates REGINA, as pastilhas "Pirata" e as pirâmides de chocolate que comprava no Sr. Narciso, o café mesmo colado à nossa porta...





SONS/IMAGENS
Alguns dos discos em vinil que eu mais ouvi, entre os 8 e os 12 anos



IMAGENS/SONS
Algumas das séries que mais me apaixonavam e que eu via à hora do lanche, com uma grande caneca de leite com Nesquick e uma pilha de bolachas "Maria" com doce...



IMAGENS/TACTO
O puzzle de 500 peças que fiz tantas vezes, e cuja imagem conheço de cor, sem saber que se tratava da Divina Comédia de Dante, segundo um quadro de Domenico de Michelino, do séc.XV


IMAGINAÇÃO: OS 5 SENTIDOS EM ACÇÃO
Alguns dos livros que li vezes sem conta...as colecções inteiras, claro!





E aqui imagens vivas, para melhor matar saudades de um tempo de inocência que não volta e que guardamos como um bem precioso.




(ACRESCENTADO QUASE 2 SEMANAS MAIS TARDE, EM HOMENAGEM AO MÁRIO DE SOUSA, QUE AQUI DEIXOU, EM TRÊS COMENTÁRIOS, UMA HISTÓRIA QUE ME COMOVEU.)

quarta-feira, 27 de abril de 2011

Underwood, Wonderland

Depois de uma notícia publicada na imprensa, as máquinas de escrever, para os mais nostálgicos, estão na ordem do dia. Corre para aí que se anuncia o fim deste suporte de escrita, com o fecho de uma fábrica algures na Índia, que resistia ao desenvolvimento das novas tecnologias.
Desenganem-se, vá. Em primeiro lugar, porque ainda existem imensas por esse mundo fora; em segundo, porque não é bem assim...senão, vejam esta notícia saida Washington Post

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terça-feira, 26 de abril de 2011

Navegando...

"Uma manhã, pelas três horas, enquanto eles sonhavam tranquilamente sob a sua mortalha de nevoeiro, ouviram como que um ruído de vozes, cujo timbre lhes pareceu estranho e desconhecido. Olhavam uns para os outros, os que estavam no tombadilho, interrogando-se num relance dos olhos:
- Quem é que falou?
Não, ninguém; ninguém dissera nada.
E, efectivamente, aquilo tinha toda a aparência de vir de fora.
Então o que estava encarregado da trompa, e que a pusera de parte desde a véspera, correu acima, soprando com toda a sua força para soltar o longo mugido de alarme.
Só aquilo já fazia estremecer, no silêncio. E depois, como se, pelo contrário, houvesse sido convocada uma aparição por esse som vibrante, uma coisa grande, imprevista se desenhara em pardacento, se erguera ameaçadora, muito alta, ao pé deles: mastros, vergas, cordame, um desenho de navio, que se esboçara no ar, por toda a parte ao mesmo tempo e de um só traço, como fantasmagorias para assustar, que, de um só jacto de luz, são criadas sobre velas pandas. E outros homens apareciam ali, a tocar-lhes, debruçados na amurada, mirando-os com os olhos muito abertos, num despertar de surpresa e de espanto.
Atiraram-se aos remos, aos mastros de sobressalente, aos croques, tudo quanto se lhes deparou de comprido e de sólido, - e apontavam-nos para fora, para manter a distância daquela coisa e dos visitantes que lhes chegavam. E os outros também assustados, estendiam para eles paus enormes para os repelir.
Mas houve apenas um ligeiríssimo estalido nas vergas, por cima das cabeças, e as mastreações, por um momento enganchadas, logo se desembaraçaram sem avaria alguma; o choque, muito suave, por aquela calma, estava completamente amortecido; fora mesmo tão fraco, que realmente parecia que o outro navio não tinha massa, que era uma coisa mole, quase sem peso...
Então, passada a surpresa, os homens puseram-se a rir; reconheciam-se uns aos outros:
- Ó gente do Maria!
- Eh! Gaos, Laumec, Guermeur!
A aparição era o Raínha Bertha, capitão Larvoer, também de Paimpol; aqueles marinheiros eram das aldeias dos arredores; o alto, de barba preta cerrada, mostrando os dentes quando se ria, era Kerjegou, um de Ploudaniel; e os outros vinham de Plounés ou de Plounerin,
- Porque é que vocês não tocaram a trompa, bando de selvagens?"
("O Pescador da Islândia", de PIERRE LOTI)
Obrigada, Bé, por não deitar fora os livros velhos do seu pai e se lembrar desta sua vizinha meia louca, que sente um prazer imenso em desfolhar as páginas bafientas e amarelecidas de edições a 6$00, forradas a papel vegetal. Neste caso, trata-se de uma obra de Pierre Loti, oficial de Marinha e escritor, que, entre outros autores, influenciou Marcel Proust na forma magistral de construir uma descrição narrativa. Sendo eu filha de oficial, sinto especial comoção em descobrir livros que me fazem recordar os tempos da minha infância. Ando a roubar dias solarengos desta Primavera, escapando-me para os mares gelados da Bretanha e da Islândia, no conforto preguiçoso da minha casa, semeada em terra firme.
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sábado, 23 de abril de 2011

Agustina

Em jeito de celebração do Dia do Livro. Obrigada, P.

Lídia Jorge

Como só me aconteceu com poucos livros, li "O Dia dos Prodígios" duas vezes seguidas. Porque fiquei assim, com uma vontade urgente de regressar a Vilamaninhos e à Carminha limpando a sua janela, na primeira página. Deixo aqui uma fatia de prosa sem diálogo, em jeito de amostra de uma escrita singular, de um livro assombroso. José Pássaro Volante, Branca, José Jorge Júnior, Jesuína Palha, Macário, Manuel Gertrudes e outros personagens inesquecíveis, no prodígio das palavras que trocam uns com os outros, movimentando-se num cenário descrito em pormenor, num jeito que espicaça a nossa imaginação e os nossos sentidos. Livro maravilhoso e muito, muito português, terminado em 1978, em Boliqueime, no Algarve, de onde a autora é natural.

"Já pela tarde Carminha abriu a janela do quarto para olhar verdadeiramente a rua, e pensou. O futuro é o presente a andar lentamente para trás. Na verdade abafava-se dentro de casa ou à janela, e mesmo sobre a calçada se ouvia o sussurro dos gafanhotos pedalando de pasto em pasto. Os telhados ondulavam sobre as paredes como se fossem cair e as paredes das casas abriam bocas como se fossem romper-se. Desabar no chão. As caiações eram tão últimas que já resplandeciam de amarelo e se listavam de ocre definitivo. As lagartixas postavam-se esgalgadas como se fossem donas de todos os muros. Pelos quintais as piteiras de folhas e espinhos estavam espetadas e ferozes como se fossem unhas. Aceradas. Atrás das casas as oliveiras  estavam cinzentas como se fossem mariolão do mato. Mas sem flores. O rio em baixo tão seco como se fosse uma estrada de pó, o mar distante como se fosse uma fotografia. E do outro lado, a linha da terra esbatia-se cinzenta na luz como se fosse deserto. Carminha recolheu o olhar sobre os pés. Os ladrilhos tão fendidos como se fossem mosaico, o algermolho de vinagre como se fosse purgante, o orégão cheiroso como se fosse incenso. E as paredes. Levantadas como se fossem prisão de todos os móveis. Carminha desviou o cortinado. Pelas ruas as sombras nítidas como se fossem pintadas. Independentes dos seres. As gateiras tão largas como se fossem para bácoros. E as cavalariças. Sabia-se. Tão cheias de palha como se fossem só para galinhas. Pelas cozinhas, espirros tão fortes como detonações de cuspo e ar. Pelos postigos, cabeças pretas espreitando como se fossem vigias,  e no largo homens suando como se fossem de sal. E o sol tão rubro como um forno incendiado. Um afrontamento na alma. A tarde inteira a cair como se fosse uma porta. E Carminha pensou. O pó desta casa. Pode-se pegar pelas pontas e dobrá-lo. Fazer com ele um embrulho como papel de jornal."
(LÍDIA JORGE, 1º romance, 1980)

quinta-feira, 21 de abril de 2011

Filosofices VI

Se eu voltasse a ser uma criança, havia de querer fazer uma série de perguntas que na altura não me ocorreram. Agora que sou crescida, até parece mal, mas mal que pergunte...

Se eu te tratar por tu consigo dizer contigo, mas se o tratasse por você tinha de conseguir dizer consigo?

Porque é que os segundos do relógio não se chamam terceiros? Em primeiro lugar, vêm as horas; em segundo, os minutos; em terceiro, os segundos, ou não é? Então, pronto, chamavam horas às horas, primeiros aos minutos e aí, sim, fazia sentido chamar segundos aos segundos…digo eu.

Porque é que as prisões não se chamam “detergente”, se detêm gente? E o detergente propriamente dito, não devia chamar-se deternódoas ou detersujo? São coisas que não consigo perceber.

Não gosto de caçadores, mas gostava que os homens caçassem a dor. isso é que era, não era?

Já uma vez falei das ameias e dos merlões chanfrados - que parecem doidos, mas não são - e continuo sem perceber: porque é que as ameias se chamam assim? Eram partilhadas pelos seteiros? Dois em cada buraco, a meias? E já agora, porque é que as meias dão a entender que se ficam por metades, se são uma peça inteira? Há meias desirmanadas…podemos dizer então que são quartas? Se eu dissesse “perdi uma quarta”, todos entenderiam, certo? É tudo uma questão de lógica, acho eu. Mas se alguém me perguntar se eu gostei das meias que me ofereceu, posso sempre responder: “amei-as!”

E o verbo "demonstrar" é tirar o monstro?

Pronto, isto era o que eu perguntava se fosse criança, mas agora sou crescida, já não dá.

(pesquise em "Filosofices" I, II, III, IV e V para mais)

quarta-feira, 20 de abril de 2011

Óculos de sol

Arrumar os cantos à casa, com vagar, acaba sempre por representar várias viagens no tempo: uma fotografia que espreita, uma carta, um postal, um guardanapo escrevinhado, um torrão de açucar que guardámos num aceso de sentimentalismo. De filhos e sobrinhos que crescem tão depressa nem é bom falar. Fico-me pela música, por imagens que me fazem sorrir, a pensar nas figuras que fazemos quando somos novos - a brincar ou em trabalho - neste caso concreto, em ambas, pois tive a sorte de escolher uma profissão de que gosto e com a qual me divirto. Aqui, no Verão de 1993, nos Açores, no espectáculo "Uma Noite na Obra", da autoria de Júlio Isidro. Parece que estou a ouvir-me cantar aquele número meio cómico, acompanhada pela nossa banda...


Óculos de sol (intérprete: Madalena Iglesias)

Já arranjei muito bem
Tudo quanto convém
P'ra praia levar
O pente, o espelho, o baton
E um creme muito bom
P'ra me bronzear
O meu rádio portátil
E o bikini encarnado
Também estão no meu rol
E como é bom de ver
Não podia esquecer
Os meus óculos de sol
Refrão: Que levo p'ra chorar uuuuhuh
Sem ninguém ver
P'ra não dar uuuuhuh
A perceber
P'ra ocultar uuuuhuh
O meu sofrer
Pois eu sei que te hei-de encontrar
Talvez deitado à beira-mar
Com outra lado
E eu vou passar
A tarde a chorar

terça-feira, 19 de abril de 2011

Patrícia Reis

Finalmente, ao fim de três anos e meio de muito trabalho, vai sair o novo romance de Patrícia Reis, mesmo a tempo da feira do livro. Como já vai sendo habitual nesta autora, tem um título maravilhoso: "Por este mundo acima". A acção passa-se num cenário pós-apocalíptico e é um tributo inesquecível à amizade. Como a Patrícia Reis costuma dizer, afinal, o mais importante são as pessoas. Este livro é uma excelente ilustração deste princípio. Poderão encontrá-lo na Feira do Livro e nas livrarias a partir de maio. Da minha parte, assim que puder vou comprar - não um - mas vários, para oferecer a quem é importante. Será um bom presente, um bom (pre)texto para dizer aos outros aquilo que por vezes não sabemos dizer.

domingo, 17 de abril de 2011

Citando...

Limpando o escritório ao som do álbum "Back to Bacharach" de Steve Tyrell, escuto uma frase de Hal David que me chamou a atenção:

"A room is not a house
A house is not a home"

Bem visto. Se pensarmos bem no que pode significar.

Bom Domingo

Fiquem-se com este video ma-ra-vi-lho-so, em jeito de celebração do Dia Mundial da Voz.

quinta-feira, 7 de abril de 2011

Ao domicílio

Ao fim da manhã recebemos a visita do Zé Manel e da Bé, nossos queridos vizinhos. Traziam dois sacos: um com hortaliças e frutas semeadas e colhidas por eles próprios; outro com livros velhos, aos quais a Bé já sabe que não consigo resistir. Pearl S.Buck, Tolstoi e Condessa de Ségur à mistura com laranjas, limões, espinafres, nabiças e coentros. Tudo oferta, em nome da boa vizinhança. Aqui no campo é assim. Pode aparecer uma aranha verde na mangueira, uma coruja na lareira ou um ninho de pássaros na árvore de Natal guardada na oficina; mas também temos frutas, legumes e literatura ao domicílio, embrulhados em cavaqueira e galhofa, enquanto os cães ladram, excitados com a visita matinal. Obrigada Zé Manel e Bé, por enriquecerem e alegrarem os nossos dias com boas recordações.

segunda-feira, 4 de abril de 2011

Boa semana

Por brincadeira, os pais de Jonathan, de apenas 3 anos, filmaram-no a dirigir o 4º movimento da 5ª Sinfonia de Beethoven, pela Orquestra Filarmónica de Berlim, sob a regência de Herbert von Karajan. Irresistível, este video, que se tornou num campeão de audiências  no mundo inteiro. Vejam porquê.

sexta-feira, 1 de abril de 2011

A corda

Elvis Veiguinha fez este pequeno filme como exercício para a Academia de Cinema de Nova Iorque. Os miúdos que transportam a dita são o meu filho (o louro) e os meus dois sobrinhos, Sebastião e Micas. Este já fica de recordação e ninguém me tira. Obrigada Elvis e P.

A Corda - Rodrigo Leão from Elvis Veiguinha on Vimeo.