Era uma vez um belo coelhinho. Parecia
um gelado de nata e chocolate, pois o seu pêlo era todo malhado, castanho e
branco. Vivia
num pequeno jardim guardado por um grande cão bonacheirão, chamado Castanho. O
cão parecia-se um pouco com ele: também era castanho e branco, apesar de ser
muito maior.
O
coelhinho passeava-se livremente por ali, uma vez que os seus donos o tratavam
como se fosse da família: não lhe faltavam as cenouras; brincava com o Castanho
dando-lhe dentadinhas no rabo e fugindo logo de seguida, saltitando em direcção
aos arbustos; passava o serão ao colo da D. Ermelinda, que lhe ia fazendo
festas, enquanto conversava com o marido, frente à lareira…enfim, era um coelho
feliz, que levava uma vida regalada.
Numa
linda manhã de Abril, o Sr. José decidiu pintar a casota do Castanho, cuja
madeira velha estava já muito feia. Agarrou no chapéu e foi às compras à
aldeia, na sua carrinha branca. Apareceu pouco depois com várias latas de tinta
de água, pousou-as na relva junto à casota e abriu-as: uma branca, outra
amarela, outra ainda azul mesmo-mesmo da cor do céu e, finalmente, uma
vermelha. Quando ia começar a obra, disse para com os seus botões:
"Ora ora, o que me calhava mesmo bem agora,
era uma cerveja fresquinha!" – Porque estava imenso calor. Como a D. Ermelinda se encontrava longe, na cozinha, a fazer um bolo que fazia as delícias da filha e dos netos, que
estavam para chegar, resolveu levantar-se e ir ele mesmo buscá-la.
Passados
instantes, chegou o coelhinho, atraído por aquele cheiro novo de tinta fresca. Ao ver as cores a brilhar ao
sol, achou-as bonitas. Aproximou mais o focinho e os bigodes para espreitar
e... Ops, asneira! Entornou duas latas de tinta! O azul e o amarelo
espalharam-se por todo o lado e arranjaram uma cor nova:
Qual
era? O verde!
Ficou
muito espantado com o que tinha arranjado e não resistiu a espreitar melhor as
outras cores: empoleirando-se com as patas na lata vermelha, pumba! Fez asneira
outra vez! Ela tombou e o coelho Chocolate, com o peso, desequilibrou-se e foi
cair em cima da lata de tinta branca! Agora é que a tinha arranjado bonita!
Estava tudo entornado e, ainda por cima, cada vez que saltava, as suas patas
deixavam marcas… …. Cor-de-rosa!
Nesse
momento, curiosos com a confusão que reinava no jardim, chegaram o Castanho e o
Sr. José, a correr:
"Chocolate! O que é que me foste arranjar?!
Olha bem para isto, sim senhor, lindo serviço!" - ralhou o Sr. José.
O Coelhinho olhou para
ele com os olhos maiores e mais doces que sabia fazer, para não apanhar uma palmada.
Era preciso ver aquela confusão de cores! O Castanho, todo satisfeito por ver o
jardim mais colorido do que nunca, juntou-se ao Coelhinho Chocolate, lambeu-o e
ficou com a língua pintada; depois, com a cauda a abanar, espalhou mais tinta por
todo o lado. Agora havia roxo, castanho e cor-de-laranja também! Até as flores
do jardim ficaram com as suas cores trocadas!
Pensam
que a D. Ermelinda se zangou quando, ao chegar, viu aquela confusão? Estão
enganados! Como era uma senhora muito bem disposta, não conseguiu conter o riso
e desatou às gargalhadas. E o riso, que se pega como os bocejos e a tosse, contagiou
o Sr. José, que acabou por rir também, e nem ficou zangado, pois reparou que o
que sobrara nas latas ainda daria para fazer o trabalho.
"Ai, que eles estão quase a chegar!" -
Exclamou a D. Ermelinda, pondo-se séria de repente - Vá, toca a tomar banho,
seus marotos, antes que essa tinta seque!"
O
que valeu a todos, é que a senhora adiantara trabalho, como era seu hábito, e,
assim, dispôs de tempo para aquele imprevisto. Pegou no Chocolate e foi dar-lhe
uma boa ensaboadela na banheira, com água morna. Quanto ao Castanho, foi lavado
ali mesmo no jardim, com a mangueira, para aprender a ficar quieto! O Sr. José
esfregou-o bem esfregado com um champô especial, até ficarem apenas as suas
cores: castanho e branco.
Ao
fim da tarde, a D. Ermelinda abriu a mesa no jardim, fez laranjada para as
crianças e chá para os adultos, a acompanhar as grandes fatias de pão e de bolo
de chocolate.
Por
falar em chocolate, onde ficou o coelhinho? Ah, esse ficou amarrado ao poste,
de castigo! E o seu amigo Castanho, que detestava tomar banho, passou o resto
do dia muito sossegado e um pouco amuado com o dono, que o lavara com água
fria. No entanto, nessa noite, já poderia dormir regalado, na sua linda casota,
que estava agora como nova, pintada com as sete cores do arco-íris! Frente à
porta podia ler-se:
"CUIDADO!
PINTADO DE FRESCO!"
PÁSCOA FELIZ PARA TODOS
OS PEQUENINOS E CRESCIDOS!
(VERA DE VILHENA, inédito, 2003)
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