terça-feira, 24 de novembro de 2015

Tabula Rasa

Regresso à rotina. Apesar de ter levado comigo o portátil para o Festival Literário Tabula Rasa, em Fátima, o programa foi tão intenso e rico que não houve tempo para a "manutenção" das minhas páginas, senão para ir postando directamente no facebook a notícia e as imagens dos convidados. O balanço destes cinco dias foi muito bom. Deixo aqui alguns excertos do texto "A escrita como interrogação", que li no sábado passado. Por companhia na mesa redonda (por que é que lhe chamam mesa redonda, se é rectangular? Nunca hei-de perceber) Maria João Carvalho, Luísa Janeirinho e Renato Epifânio, o organizador e anfitrião deste primeiro Festival Tabula Rasa.

« (...) também o escritor, embrenhado no seu ofício como viajante solitário, por vezes quase cego, de mãos atadas, poderá desembocar em território inesperado, levado pela vontade insolente das suas personagens, quem sabe também elas se interrogando. Como leitores atentos, apenas podemos adivinhar, pressentir e admirar a perícia do escritor, que ao escrever é receptáculo de pensamentos que vão tomando forma, respirando, com prazer, a poalha de mistério oculta no grão das suas palavras, na sede de compreender, de livro para livro, que lugar, que marca irá deixar no mundo, e que estranha mania é aquela de escrever sem ter outra saída...»

»Se o filósofo é «aquele que procura a sabedoria, que ama o saber, que indaga a verdade dos valores morais e estéticos, da mente e da linguagem», o escritor, por sua vez, vai apurando a estética da sua escrita e deixando, de obra em obra, indícios da sua moral e tentando, em tantos caSos, atingir o Belo, a Perfeição. Ao tentar dar resposta aos seus próprios mistérios, provoca em nós, leitores, novas perguntas e espantos, Nesse caso, é um responder perguntando, pois a interrogação pode, também ela, trazer o reflexo da sabedoria. É preciso saber para perguntar. A dúvida pressupõe pensamento, conhecimento.»

«Um livro fechado, por ler, é um livro mudo. Os livros sem leitores seriam como cores encerradas num quarto escuro, invisíveis, sem sentido.»

Intercalei com um punhado de "Filosofices", que conquistaram bastante simpatia, e terminei num registo filosófico e intimista. Aqui vos deixo um último excerto:

«Na (minha) adolescência, deu-se o inevitável: a escrita de versos. Decerto horríveis, recheados de pirosices, de exclamações...de pontos de interrogação...até descobrir que as interrogações que certos autores semeavam em mim eram muito mais interessantes.

E fui crescendo, vou crescendo, como todos nós, descobrindo com pasmo, que ao fim de tantas leituras complexas, o olhar se vai esbatendo… tornando-se desfocado outra vez, as certezas transformando-se em incertezas, as interrogações ganhando às respostas… uma visão que nos vai encostando a um capítulo final, um epílogo no qual adivinho uma simplicidade que desarma. E porque andarmos desarmados é um ideal que todos deveríamos conquistar, apostemos na Literatura.» 

sábado, 14 de novembro de 2015

Filosofices X

Se eu voltasse a ser uma criança, havia de querer fazer uma série de perguntas que na altura não me ocorreram. Agora que sou crescida, até parece mal, mas mal que pergunte...

Se «pedregulho» vem de «pedra», porque é que não é «pedragulho»? E se escrevemos «braguilha», por que dizemos nós «breguilha»? Ou vá, porque não passamos a escrever «breguilha» E«muinto»? Quem é que diz «mui»? Isto mói, pois mói-me muinto o juízo.


Importar
Eu não me importo. Ok, até aí, a malta entende. E o contrário? Eu não me exporto?
Se o "importante" é "o que importa", o que exporta não deveria ser o "exportante"?

Por que é que dizemos que um anjo tem "asas", se depois lhe chamamos um "ser alado"? Então não devia ser "asado"? Ou então dizíamos que os pássaros e os anjos têm "alas", não é? Eu fico completamente desasada com isto... ou desalada? Que é uma salada, é.

E digam-me: se "falecer" é morrer, por que é que "desfalecer" não é nascer? É que desfaleço com estas dúvidas! Ou será que volto a nascer? Eu sei lá, eu cá não sei!

Só mais uma, para acabar: 
Se uma "livraria" vende livros, por que é que não lhe chamam "livroria". Estão a ver? Não me livro destas confusões, livra! 
Pronto, isto era o que eu perguntava se fosse criança, mas agora sou crescida, já não dá.
(Gostaram? Pesquisem na etiqueta "filosofices", para lerem mais, ou então no site GAVETAS E GAVETINHAS, onde tenho algumas delas mais bem arrumadas, nas "gavetas do meio" :-)
Para festejar a décima série de Filosofices, esta é dedicada às minhas queridas amigas Bé e Stella. :-) :-)

sexta-feira, 13 de novembro de 2015

Paris

PARIS: BELA ADORMECIDA
Estamos assim, rodeados de espinhos, tristes e chocados perante todos aqueles que ficaram por terra, mas que infelizmente não moram nos contos de fada, para despertarem cem anos mais tarde e retomarem as suas vidas. Como seria bom sermos reis e mandarmos destruir todas as armas, como se fossem rocas de fiar...







quinta-feira, 12 de novembro de 2015

Gregory Parker


Descobri hoje este senhor. O que significa que devo andar mesmo por fora....! É que ele ganhou, no ano passado, o Grammy para Best Jazz Vocal Album, que, em anos anteriores, já foi entregue a Ella Fitzgerald, Al Jarreau, Lena Horne, Take 6, Natalie Cole, Bobby McFerrin, Dianne Reaves, Diana Krall, Esperanza Spalding, entre outros. A minha amiga Magda faz anos hoje, e eu é que ganhei um presente! :-)
Parabéns, Magda! É claro que este tema te é dedicado, neste dia que é um bocadinho mais teu que dos outros.



Be good
Be good is her name
And I sing my lion's song and brush my mane
She would and she could
So she pulled my lion's tail and caused me pain

She said lion's are made for cages
Just to look at in delight
You dare not let 'em walk around
'cause they might just bite

Does she know what she does
when she dances 'round my cage and says her name?
Be good.. Be good

Be good is her name
I trim my lion's claw and I, I cut my mane
And I would, if I could
But that woman treats me the same

She said lion's are made for cages
Just too look at in delight
You dare not let em walk around
'cause they might just bite

Does she know what she does
when she dances around my cage?

Be good is her name
I sing my lion's sing, brush my mane
And she would if she could
so she pulled my lion's tail and caused me pain

She said lion's are made for cages
Just to look at in delight
You dare not let 'em walk around
'cause they might just bite

Does she know what she does
when she dances around my cage?

Be good is her name
I trim my lions' claws, and I... and I cut my mane
And I would if I could
But be good, treats me the same

She said lion's are made for cages
Just to look at in delight
You dare not let 'em walk around
'cause they might just bite

Does she know what she does
when she dances around my cage?
She dances round my cage
Does she know?
Does she know?

Be good, be good, be good, be good

segunda-feira, 9 de novembro de 2015

Na hora da morte


Palavras e expressões que odeio:

CONDOLÊNCIAS: Porque não nos é natural, não faz parte do nosso vocabulário no dia a dia, da nossa colecção de palavras mais sinceras. Além de que a palavra em si é feia, grotesca, torta, como "transeunte". "Os meus sentimentos" soa tão melhor...se eu fosse Ministra das Palavras Portuguesas, bania esta, tipo Rainha de Copas, off with his head!

RIP - Será que nos importamos tão pouco, com o Outro, com os outros? Será que somos assim tão passivos e preguiçosos, que não temos maneira de escrever por extenso "rest in peace"? O RIP remete para o verbo "Ripar", pregar ripas, serrar, cortar; além da linguagem informática: "fazer cópia, geralmente ilegal, de um conteúdo digital de um suporte electrónico para outro.". E como portugueses que somos, já que temos de  escolher uma sigla patética na hora da morte, ao menos façamo-lo em português, D.E.P. - descansa em paz. - O que diz de nós, esta coisa de escrevermos "RIP" no mural dos que acabam de partir? Mais valia ficarmos em silêncio, se é para darmos tão pouco.
Hoje perdemos mais um dos nossos: Luís Filipe Aguiar. 
Na verdade, não há palavras elegantes na hora da morte, que mais não é do que um ponto absolutamente final.
Não há palavras.
Não há.
Não.
.
.
.

quarta-feira, 4 de novembro de 2015

Novembro

Do meu escritório, 2 Novembro 2015
Abro a janela do quarto ao anoitecer. É Novembro. Há luzes amarelas e minúsculas na linha do horizonte. Os cães ladram ao longe. A brisa, a temperatura amena num prenúncio de frio que ainda não causa dano. Olhando o vale, agradeço o concerto privado que me oferecem os grilos e as rãs... e o cheiro, este perfume que chega com a chuva, um perfume que inspiro às golfadas, para que a alma respire a terra molhada. O céu antracite e lilás anuncia novo aguaceiro mas não importa, nada importa quando eu e a terra nos alimentamos assim, uma à outra. 

terça-feira, 3 de novembro de 2015

Ondos do mar

A Arte Contemporânea e Moderna podem ser, muitas vezes, uma estopada... mas também podem trazer-nos coisas espantosas como esta.

Coreografia: James O' Hara e Sidi Larbi Cherkaoui
Música: Micrologus
Performed at Cross Connections Gala Copenhagen 2010

segunda-feira, 2 de novembro de 2015

A Casa

Uma velha muito velha vivia numa casa escondida no meio de uma floresta, onde a luz mal conseguia entrar. Sobre a casa pairava um nevoeiro esverdeado com laivos de ouro, que as lanças do sol formavam ao trespassar os ramos do arvoredo, enquanto a lua não chegava com o seu vestido de feiticeira.
Durante o dia o silêncio era rei daquele lugar. Apenas o vento se escutava, silvando, a fazer dançar o tédio dos salgueiros, a tristeza dos ciprestes que rodeavam a casa de musgo. Durante a noite, porém, os ruídos surgiam, feitos de bichos alados, rasteiros e marinhos; com muitas patas e antenas e dentes e pelagem coberta de imundice.
Nessas horas, em que a lua era soberana, as trevas revelavam tons de prata. Cristais de gelo e uma poalha azul-cobalto cobriam a folhagem, inundando a floresta de segredos que se escondem na sedução do frio, como tímida flor nascendo, por miragem, num manto de neve. 
Assim se comportava o jardim selvagem que rodeava a casa da velha, escondida na floresta onde a luz mal se atrevia. Estranho comportamento é certo, tão contrário às leis naturais, não fosse a floresta o cenário verdadeiro da história que aqui se conta, tal como aconteceu. 
Do lado onde o sol se deitava estendia-se um pântano de águas lamacentas cor de caramelo de leite, habitado por crocodilos, rãs e serpentes, e onde dormiam espectros de afogados e esqueletos de velhas embarcações naufragadas, que as correntes do rio haviam empurrado até àquele fim de mundo sem saída. Um tempo houve em que o pântano era outra coisa, que não aquele tristonho composto de terras peganhentas e infectas. Agora a chuva limpa, vinda dos céus, não caía ali, como se uma imensa abóbada de humidade e calor sobrevoasse o que agora mais não era do que um lamaçal, fruto de uma qualquer maldição: que maldição seria essa?
(conto juvenil em construção, 2015)