segunda-feira, 2 de novembro de 2015

A Casa

Uma velha muito velha vivia numa casa escondida no meio de uma floresta, onde a luz mal conseguia entrar. Sobre a casa pairava um nevoeiro esverdeado com laivos de ouro, que as lanças do sol formavam ao trespassar os ramos do arvoredo, enquanto a lua não chegava com o seu vestido de feiticeira.
Durante o dia o silêncio era rei daquele lugar. Apenas o vento se escutava, silvando, a fazer dançar o tédio dos salgueiros, a tristeza dos ciprestes que rodeavam a casa de musgo. Durante a noite, porém, os ruídos surgiam, feitos de bichos alados, rasteiros e marinhos; com muitas patas e antenas e dentes e pelagem coberta de imundice.
Nessas horas, em que a lua era soberana, as trevas revelavam tons de prata. Cristais de gelo e uma poalha azul-cobalto cobriam a folhagem, inundando a floresta de segredos que se escondem na sedução do frio, como tímida flor nascendo, por miragem, num manto de neve. 
Assim se comportava o jardim selvagem que rodeava a casa da velha, escondida na floresta onde a luz mal se atrevia. Estranho comportamento é certo, tão contrário às leis naturais, não fosse a floresta o cenário verdadeiro da história que aqui se conta, tal como aconteceu. 
Do lado onde o sol se deitava estendia-se um pântano de águas lamacentas cor de caramelo de leite, habitado por crocodilos, rãs e serpentes, e onde dormiam espectros de afogados e esqueletos de velhas embarcações naufragadas, que as correntes do rio haviam empurrado até àquele fim de mundo sem saída. Um tempo houve em que o pântano era outra coisa, que não aquele tristonho composto de terras peganhentas e infectas. Agora a chuva limpa, vinda dos céus, não caía ali, como se uma imensa abóbada de humidade e calor sobrevoasse o que agora mais não era do que um lamaçal, fruto de uma qualquer maldição: que maldição seria essa?
(conto juvenil em construção, 2015) 

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