quinta-feira, 25 de dezembro de 2014

Desejos



Em jeito de oferenda natalícia, no dia em que celebramos o nascimento do menino Jesus...
 
«A Casa suspirou, abrindo fendas minúsculas nas paredes. Aqueles seus olhos insatisfeitos pareciam não lhe pertencer. Também ela sabia que o mundo era maior do que aquilo que podia observar a partir das suas janelas, pois escutara os relatos de viagens que os donos realizavam, quando a encerravam durante muitos dias e muitas noites. Por mais que a vida do jardim se modificasse à passagem das estações, não parecia suficiente; por mais contacto que tivesse com pessoas distintas e testemunhasse o crescimento das crianças, o lugar era sempre o mesmo. Era a sua casa. E na verdade seria assim tão terrível pertencer a uma casa, a um lugar seguro?
            Como eram ingratos, os seus olhos, pensava a Casa.

            A Janela, porém, não se conformava com a sua imobilidade.
À noite, sonhava em partir, como tapete voador quadriculado, sobrevoando outras casas; as torres das igrejas, lagos e planícies; cidades modernas e bem iluminadas; florestas e desertos; aldeias paradas no tempo. À hora em que todos dormiam e a escuridão brilhava lá fora, no esplendor das suas trevas, podia apenas imaginar, sob as pálpebras cerradas, que percorria esses lugares encantadores.
Por vezes, a Janela da Casa perguntava à Lua:
− Tu, que tens um corpo de redonda luz, que vês quando a Noite vem?
E a Lua, inchada no seu orgulho, sempre respondia:
− Tudo vejo em sombras tingidas de azul. Mas o que mais admiro, é o meu corpo de prata, estendido sobre as águas negras.
            Como era vaidosa, a Lua, pensava a Janela.»
(© Vera de Vilhena, excerto inédito, in "O jardim dos desejos) 
FESTAS FELIZES PARA TODOS

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