Conhecem a velha expressão "it's a dirty job but somebody has to do it"? Assim é. Neste caso, eu, já que não tenho empregada. Uma casa é uma criança caprichosa: se a queremos ver feliz, sorridente, luminosa, temos de lhe consagrar muita atenção; de contrário, começa a fazer birras, a virar-se contra nós. Havia cantos da casa que, amuados, já haviam desistido de se queixar. E foi nesse momento que senti pena dela, da casa, e fui salvá-la. Coitada, sete anos de idade, uma criança ainda...e eu, mãe desnaturada.
A resolução foi tomada e o resto terá de esperar. Dedico-lhe agora algumas horas, regatando-a ao abandono:
Dou colo ao recheio das gavetas;
Alimento-a com óleo de cedro;
Dou-lhe banhos com água morna e bolhinhas de sabão;
Esfrego-lhe todos os refegos e covinhas onde se esconde o cotão e o suor inocente;
Aspiro-lhe a pele húmida;
Penteio cada madeixa caída, experimento-lhe novos penteados;
Visto-a com roupas limpas, deixando-a arrumada;
Saio com ela à rua, o carrinho à porta.
E quando a primavera chegar, não me escapas, Casa da Lua: acaba-se-te o Carnaval, essa cara de criança pobre, vagabunda: serás azul e branca outra vez, como no dia em que nasceste. Porque todos precisamos de mimos.