sexta-feira, 18 de abril de 2014

Crónica de uma tertúlia e uma morte anunciada

Uma tarde tecida em preguiça, pouco ou nada de jeito. Chegaram as oito e depois de umas massas, feitas e enfiadas na boca à pressa, empurradas com um copo de tinto, parti com a Dila Sá para Lisboa, rumo à tertúlia no Carmo, no café do Teatro Rápido. Rever a Alice foi uma festa e uma emoção, como sempre. A sala estava bastante composta e a Alice foi igual a si mesma, graças a deus, brindando-nos com o seu bom humor, a sua atitude despretensiosa e simpatia. Foi havendo leitura e declamação de versos. A Alice voltava, voltava sempre, a bem do riso, empurrando para o Samuel Pimenta "os textos sérios". Espicaçada generosamente pela Dila e por um copo de sangria de vinho branco, lá fui eu ler um texto: escolhi o conto "Língua afiada", do meu novo livro "Coisandês", baseado na personificação de uma Guilhotina, palavra que, curiosamente, a Alice acabara de referir no início da tertúlia, falando no poder sedutor das palavras, como sendo uma das preferidas da sua juventude: um acaso feliz, que fez a ponte perfeita para eu pespegar com um conto, de humor negro, no meio da seriedade dos versos. Relembrámos, graças à Dila, a actualidade da história "El rei Tadinho", e, mais uma vez, a Alice fez por deixar claro que a literatura, a escrita, a leitura, não têm de ser levadas sempre tão a sério. O Abel Dias também deu um ar de sua graça, até que o Samuel Pimenta, um dos organizadores destas tertúlias realizadas às 5ªas feiras, deu por terminada a sessão.
Quando liguei o televisor ao chegar a casa, levei com a morte de Gabriel Garcia Marquez. Todos contávamos com ela, já nos fora anunciada, mas a tristeza não quis saber e apareceu à mesma.
Deitei-me na companhia do grosso volume da Dom Quixote, "Viver para contá-la", para que Garcia Marquez me narrasse novamente a sua vida.
De certa forma, senti-me perdendo um tio-avô estrangeiro que me contava histórias. É um consolo saber, ao menos, que elas viverão por muitos anos.
Adeus, Gabito.
Disse o autor, acerca deste seu livro, que foi o que o deixou mais satisfeito como escritor. Uma história contada de forma magistral.

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