terça-feira, 23 de junho de 2015

Luto para sempre


As três folhas amarrotadas pelo uso das mãos, as mãos revelando os primeiros indícios da idade, a idade nas veias, pequenos riachos de águas inchadas, azuis, estendidas na planície da pele, os dedos magros, o lugar vago da aliança, para sempre vazio, uma vaga aberta e inútil, agora que ela se vestia de luto, para dizer adeus ao seu primeiro amor.Os olhos inchados lendo, a custo:
« Quando formos adultos e casarmos…
Tu interrompias-me, Sara, como quem afasta uma tragédia, a testa franzida, os olhos bem abertos:
– Casar contigo?! Nem morta!
Para nós não havia futuro, dizias. Teimavas em lembrar-me que era temporário, insistias em não acreditar em nós, neste futuro que foi chegando. Não estamos aqui? Não chegámos até aqui? Se estás a ler esta carta, sabes que já é futuro e nós continuamos aqui. O tempo não conseguiu silenciar-nos. Só a morte é capaz de calar para sempre.
(...)
Cada vez que me punhas de parte, a tua vida sem mim era para sempre. Era sempre para sempre. Mas fraquejavas sempre. E também na reconciliação eu conquistava a prova de que não podias viver sem mim.
Depois veio a vida e ensinou-me que afinal podias. Mas isso foi depois.

(romance em construção)

terça-feira, 16 de junho de 2015

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#Dune 27 © Nanã Sousa Dias
O chão onde pousa os pés é uma passadeira de reticências... ... ... ... ... ... ...
apetece-lhe gritar, mas tem medo de assustar os pontinhos, ficar sem chão e...

c
     a
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quarta-feira, 3 de junho de 2015

João Aguiar

Faz hoje cinco anos que perdemos o jornalista e escritor João Aguiar, que anda tão esquecido. O seu nome está normalmente associado ao romance histórico "A voz dos deuses" (que já vai em quase 30 edições), cujo protagonista é Viriato, o bravo lusitano. Acontece que, além dessa obra, escreveu muitas outras. Do que li, as minhas preferências vão para "O Navegador Solitário" e "Diálogo das Compensadas". Prolífico, dono de um excelente sentido de humor, de imaginação, domínio da palava escrita e rigor histórico, foi também autor de uma considerável obra dedicada aos leitores mais jovens, sendo a colecção mais conhecida O Bando dos Quatro.
Tive o privilégio de me corresponder com ele nos últimos anos da sua vida. João Aguiar foi de uma extrema simpatia: inclusive, enviou-me, com dedicatória, dois livros seus, "O Priorado do Cifrão", sátira escrita no âmbito da febre originada pelo famoso bestseller de Dan Brown, e "O Tigre Sentado", que quase não teve distribuição em Portugal mas em Macau. O autor d' "Os Comedores de Pérolas" morreu demasiado cedo, aos 67 anos, e foi impedido de nos presentear com outros livros que não foi a tempo de escrever.
E por falar nisso, já é tempo de reeditarem alguns dos seus livros, não? A 9ª edição do Navegador Solitário está esgotada e é, sem dúvida, um dos melhores que escreveu. Os Comedores de Pérolas foi reeditado em 2013, com uma capa bem mais apelativa do que as anteriores. Deixou, para todas as idades, dos 10 aos 100, 33 livros. É obra. Não o esqueçamos, por favor.
Dedico este post ao Nanã.





terça-feira, 2 de junho de 2015

Não me queixo

O ofício de escritor pode ser frágil e colorido como um vitral.
A feira formada por corredores cheios de cor, forrados de livros, livros, livros. Era Dia da Criança, mas as crianças estavam na escola, não podiam pedir autógrafos aos escritores. 
Cheguei já a barriga dava horas, o pequeno-almoço distante, o estômago a implorar por alimento. Depois de me ir buscar a Ribamar, perto da Ericeira, a minha editora deixou-me instalada na mesa de autor, com alguns exemplares do Coisandês, e foi buscar-me almoço. Chegou o fotógrafo da Activa, para uma pequena entrevista. A nós juntou-se a jornalista Catarina Fonseca, que me ajudou a passar aquela hora de constrangimento de uma autora novata, que está ali a uma 2ª feira a meio da tarde. 
Às quatro chegou o Alexandre Honrado, que me fez rir e com quem simpatizei de imediato. Ele e a Catarina, que já terminara a pequena entrevista e despachara as fotos da "avodrasta", deram um longo abraço cúmplice de camaradas.  
Ainda revi a minha colega Joana Macieira e de novo provei os seus "Queques com Alma", desta vez um de aveia e chocolate, maravilhoso. 
Passeei-me pela feira, parei para lanchar, quando os pés já pediam: um scone simples, uma limonada de maracujá e um café, tudo muito bom. Os feirantes gostam de mimar quem anda por ali, a namoriscar os livros. 
E foi precisamente nos livros que me desforrei do meu fracasso: "Memórias de Adriano", de M. Yourcenar (Ulisseia, Grupo Babel), "A Paixão Segundo G.H., de Clarice Lispector (Relógio d'Água) e dois do Nobel islandês Haldór Laxness: "Gente Independente" e "Os Peixes Também Sabem Cantar" (Cavalo de Ferro). 
No pavilhão da Chiado Editora, fui dar com a minha Ilha de Melquisedech embalada em papel transparente, pack 2 em 1, com um livro sobre cristais...preço do pack: 5 euros. Por momentos não soube se havia de rir ou de chorar. Optei por rir e colocar o meu livro em primeiro plano, para os ajudar a despachá-lo ainda mais depressa. 
Quando regressei ao pavilhão da Babel, estava a autora Maria Teresa Maia Gonzalez, minha colega na área juvenil, e que eu ainda não tinha tido o prazer de conhecer. 
Da minha editora ainda recebi três miminhos, ao fim da tarde: um boné da colecção "Sisters", e um bloco e um mouse pad da Mafalda.  
A Maria José veio trazer-me a casa, chegámos já era noite, distraímo-nos à conversa e, quando reparámos, já íamos em Torres Vedras. 
Autógrafos, zero. Mas o balanço do dia foi bom. Tenho aprendido a manter baixas as expectativas. E o que vem é bem-vindo. Tive, decerto, um dia bem mais simpático do que muito boa gente. Não há lugar para queixumes.
Alexandre Honrado
Joana Macieira
Maria Teresa Maia Gonzalez

segunda-feira, 1 de junho de 2015

December Boys


Para celebrar o Dia Mundial da Criança, partilho um filme comovente que vi ontem, ao serão: "December Boys" (2007), Hollywood HD. E agora vou ali à Feira do Livro com o Coisandês e já volto :-)