Daniel
Preston, psicoterapeuta mais conhecido por “D. Pression”, está incapaz de
encontrar prazer nos tesouros da cidade londrina. Não há montra nem peça que prendam a sua atenção inteira. Os doentes sugam-lhe a
felicidade, a paz, além de lhe porem alcunhas crueis. Depois há aquele sentimento que
não pode ter, nem sabe como arrancar do peito e da consciência.
Solta
um grito em pleno parque e assusta os pombos. Um deles deixa cair o recheio dos
intestinos sobre o seu ombro esquerdo, do lado do coração. Deprimido, arranca
para o escritório. É urgente limpar-se antes de ela chegar. Recompor-se.
Ela
chega. Senta-se. Desabafa. Ele mal a escuta, ocupado que está em amá-la em
segredo. Ofendida, ela sai, batendo com a porta.
Ardendo,
calada, a vela sobre a secretária nada diz. A chama dança, com a força do ar
deslocado pela porta zangada, ondeando como bailarina exótica, a barriga musculada da chama, dança
do ventre em fogo, para lá e para cá, a censurá-lo com um tss tss…a tua bela doente
saiu, reparaste? Doente anda ele, com a paixão que não pode sentir, por causa
da maldita ética profissional. Sopra a vela, como quem pede um desejo. O pavio
apaga-se, deixando-o iluminado, a sós com a sua própria chama. D. Pression sai
porta fora e chama por ela. É no corredor que lhe diz:
-
O meu silêncio chama por si, arde em pavio impossível de apagar, como aquelas
velas irritantes nos bolos, sabe?
É
um chamamento desesperado, palavras ateadas sem jeito.
Ela
ri-se e dá-lhe um longo beijo. Nesse colar de bocas vão as chamas que há muito
tentava acender nele. No beijo, um incêndio.
Sem comentários:
Enviar um comentário