sábado, 27 de fevereiro de 2010

Fúria

A minha janela é um rectângulo de folhagem inquieta. As serpentinas da tempestade anseiam por nela encontrar uma fenda e levar-me, em voo, com esse monstro ciclónico. A sua fúria descompõe a cabeleira da paisagem, emudecendo as aves, ensurdecendo os homens, enraivecendo as ondas, que explodem, ao longe. A luz oscila, inquieta e aflita, estrangulada pela cólera dos deuses. Por vezes, um quase silêncio. A quietude descerra os seus braços, acorrentados pelo vento, a tentar embalar-nos os medos. Mas logo a ira regressa, na impiedade da teimosia, chicoteando o corpo do horizonte com um assobio harmonizado, poderoso, subjugando as árvores, intimidando tudo – até os mortos – incomodados nas sepulturas.

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