domingo, 29 de julho de 2012

Sombras

Enquanto escrevo neste caderno preto há um espectro de luz reflectido no copo de cristal à minha frente. Não é este, na imagem, mas podia ser. Dentro de mim guardo a modesta porção de vinho branco que continha e por isso ele ficou assim, vazio e inútil. A sombra deitada do seu corpo, a noventa graus, é feita de manchas e ondas sobre a mesa de madeira tosca de jardim, um jardim que não tenho. 
E neste caderno dou nascimento a paraísos e infernos onde me queixo, onde me culpo e desculpo, onde rabisco interrogações sem resposta, com letra torta e irregular, e respostas para as quais não sei a pergunta. 
O cão dorme sem expectativas. É feliz. Mais sábio do que eu. No calor da tarde basta-lhe uma sombra onde pousar o peso do corpo. As orelhas movendo-se, decifrando ruídos familiares ou inimigos. Ergue a cabeça em alerta, arfando, enxota uma mosca teimosa e logo torna a deitar-se, ao ver que nada, além da paz, nos acontece.

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