Estavam casados há tantos anos, que terminavam as frases um do outro ou já não precisavam de falar. Tudo fora dito entre eles. Amavam-se assim, naquele tédio tranquilo de barco bem ancorado no cais, que conhece o movimento de cada gaivota, o desenho de cada embarcação que chega ou parte, o ritmo das ondas e das marés junto ao molhe.
Quando contava uma história a terceiros, ele acabava sempre por perguntar à mulher sentada ao seu lado:
- Ó Maria Helena, onde é que foi que vimos aqueles golfinhos a cruzarem-se na proa...?
- Em Sesimbra, Henrique.
E virando-se para ela, poucos minutos depois, perguntava novamente:
- Ó Maria Helena, em que ano é que fomos naquelas férias à Toscânia...?
- Em 1992, Henrique.
E uma outra vez ainda se socorreu da memória da sua mulher:
- Ó Maria Helena, como é que se chamava aquele nosso amigo brasileiro do Algarve...?
- Valdemar, Henrique.
E ela, virando-se para nós, comentou, com ar resignado:
- Ele às vezes julga que eu sou o motor de busca do Google...
Que bom podermos contar com alguém que nos oiça vezes sem conta.
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