segunda-feira, 14 de junho de 2010

Hoje

Comecei o dia com o carteiro a tocar à porta, para me entregar dois livros. É bom começar o dia assim, a receber livros da mão de um homenzinho de cara vermelha e enrugada pelo sol, capacete prateado e uniforme dos correios, que, no seu ar castiço, me traz muita e sofisticada literatura. Desequilibrou-se e quase caíu da mota, assustado com o Serra da Estrela que não parava de ladrar, com a fúria de quem odeia capacetes. A cabeçorra lupina, junto ao muro abaulado, apareceu-lhe de repente, enorme, a poucos centímetros da mão que segurava a caneta, para a dona assinar. A "D.Vera", a dona do cão. Chegam-me contos de Miguel Miranda, vindos do Porto, reunidos num volume da Campo das Letras, com dedicatória. Chegam-me outros contos, de Eduardo Halfón, "O Anjo Literário", que andavam esquecidos, perdidos, nas mãos de uma prima, e que recuperei hoje, com alívio. Odeio perder livros, ter de substituí-los. Como se não bastasse todos os outros que ainda queremos comprar, e tantos que jamais teremos. Pronto, voltou às mãos da dona,  poderei levá-lo na próxima sessão com os meus alunos, na Ericeira. Tenho textos deles para ler, que me chegam por email. O nosso carro à porta, com um furo no pneu da frente. Os foguetes do Santo António calaram-se. Dia 14, anos do meu pai. Telefonar, urgente. Dia de sair desta paisagem e ir a Lisboa, para o caos. Lançamento do novo disco do Paulo Gonzo, à noite, no Tivoli. É preciso ir, antes que me transforme numa flor silvestre, numa árvore, numa pedra.

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