quarta-feira, 16 de novembro de 2011

A Angèle de Renoir

Quando Renoir se apaixonava por um qualquer motivo pictórico, alugava uma habitação modesta para o ter "debaixo do nariz". O mobiliário limitava-se a uma colchão posto no soalho, uma cómoda em pinho rústico, uma mesa, uma cadeira e um fogão para o modelo se aquecer. Quando mudava de casa, deixava tudo para trás. 
A zona da Rue Moncé tinha má fama, mas "Angèle, um dos seus modelos, tinha-lhe falado numa casinha de renda barata, com um jardinzinho onde ele podia pintar. Renoir tinha ido ver. Tinha-se deixado conquistar por uma velha macieira da qual pendia um baloiço de criança, e tinha-a arrendado sem se preocupar com a vizinhança. Um dia, a caminho de casa, foi atacado por uns vagabundos. Tentou fugir, mas apesar de ter boas pernas foi atacado e manietado contra uma paliçada. De repente, um doa malfeitores reconheceu-o: "É o senhor Renoir!" O meu pai recuperou o fôlego, orgulhoso de ser tão conhecido. O outro esclareceu: "Eu já o vi com a Angèle. Não vamos fazer mal a um amigo da Angèle..." E acrescentou: "Este bairro não é seguro. Vamos acompanhá-lo até casa!". De facto, Angèle, o delicioso modelo do quadro da mulher com gato ("Posava como uma deusa"), pertencia àquele meio. Tinha por Renoir uma devoção comovedora. Um dia, percebendo que ele não tinha dinheiro para pagar a renda, ofereceu-se para "ir dar uma volta pela alameda" (...) Enquanto posava para "O Almoço dos Remadores", a rapariga conquistou um jovem de boas famílias, que se casou com ela. Alguns anos depois, veio visitar o "patrão". Vinha acompanhada do marido (...): "O Armand sabe que eu posava nua e (corando)... também sabe que eu andava em más companhias! Enquanto Armand se perdia na contemplação de um quadro, ela disse ao ouvido de Renoir: "Mas não sabe que eu dizia merda!"
(in "Pierre-Auguste Renoir, Meu pai", de JEAN RENOIR)
Quadros: "Mulher com um Gato" (1875) e "O Almoço dos Remadores" (1880-1881)

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