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Vista do lado sul, num dia de chuva |
Completam-se hoje sete anos desde que vim morar para o campo. A escolha de cumprir o sonho da vida bucólica tem o seu preço. Abandonar a cidade faz com que abdiquemos de uma série de consolos e de confortos, a troco de outros consolos e outros confortos. Tenho saudades dos meus amigos. De ser fácil estar com os que amo. Já não posso pegar em mim e aparecer numa exposição, num lançamento de um livro, num concerto, num jantar ou numa sala de cinema meia hora depois. A distância, a falta de transportes e a minha limitação de condução automóvel acabam por me aprisionar nesta imensa gaiola campestre. Acostumamo-nos a tudo, ou a quase tudo, e bem ou mal vamos fazendo por realizar os pequenos projectos que são para nós tão indispensáveis como respirar ou mover os braços. Às vezes o meu projecto de vida é apenas isto: sair. Há dias em que me arrependo da minha decisão. Há outros em que sou incapaz de entender como é que as pessoas aguentam viver diariamente mergulhadas no caos próprio da cidade, enfiadas no interior de um automóvel, respirando o fumo dos escapes, sobressaltando-se com a impaciência das buzinas, serpenteando entre edifícios que me sufocam.
A insatisfação faz parte da nossa alma tecida em íntimos caprichos.
A perfeição é uma impossibilidade.
Tenho a perfeição no regresso a casa. Ao abrir a janela do meu quarto. Ao sentir o calor da lareira, ver os cães a correr felizes, o meu filho a chegar com um saco de pinhas, de figos, de amoras...o cheiro da terra molhada em tempo de chuva, os jantares tardios com os amigos...
mas também
Tenho a perfeição no partir. Rumo ao ruído urbano, a deambular pelas ruas, pelas lojas e cafés, que me relembram que sou também um ser citadino, carente dessa pulsação acelerada, do frenesi das luzes, do atropelo das conversas, dos semáforos, dos eléctricos, dos horários apertados, do sentir-me viva entre gente que mexe. No reencontro com as coisas que perdi, torno a despertar, a sentir o sangue correndo-me nas veias.
mas
é sempre com alívio que regresso ao meu vale, perto do mar, e torno à flor silvestre que sempre fui. Por isso talvez tenha valido a pena.
Sete anos.
Sete anos de solidão. Uma doce solidão que ainda tem artes de me seduzir.
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Cogumelos ao pé de casa, caçados numa das minhas caminhadas. |