quarta-feira, 17 de setembro de 2014

Setembro

alguns fados no canto da memória,
um texto sem fim que página a página,
morosamente,
vou dissecando com o meu bisturi

a chuva, os cães, a casa,
a chuva,
janelas que abrem, janelas que fecham,
Tijolo encharcado, quadriculando as horas, os prazos,
cansaço em duras folhas que calco
E vou calculando
o ânimo na mão fechada
À espera do dia de poder ser,
cumprir o trabalho, as contas, alertas
e panos e trapos, secos, molhados,
o sol que espreita em toque-e-fuga
De novo a chuva com boca de água
Vem dizer que o nosso verão morreu.

 O ar cheira a recomeços. Recomeço-me, pois.
Reconheço-me, meço-me
pelos pequenos passos,
pinga aqui, pinga ali, o vento, a folha, a empurrar o cansaço,
a humidade dos dias encravada nas unhas,
a luz da tarde é líquido mel,
setembro avança dourando a uva arrancada
e os corvos já gritam, ralhando comigo,
não percas o fio às palavras, faz-te pássaro
e vem connosco
eu grito de volta que a hora é de ócio e
no hálito morno da minha preguiça
invento uma forma de recomeçar.
(©VERA DE VILHENA, poemas inéditos) - dedico este meu Setembro à Virgínia do Carmo

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