Li há muito tempo (e quem me dera ter tomado nota desse texto a que um dia gostaria de voltar, mas perdi completamente as referências) que Freud teria dito (ou escrito, mas vai dar no mesmo) que, no tempo em que a ópera era um espectáculo popular, o povo não a perdia porque gostava de ver sofrer em palco. Não sei se o génio austríaco estava certo quanto à ópera, porque o povo deixou de a frequentar; mas a verdade é que os nossos telejornais cheios de coisas de fazer peninha e causar horror (com velhos, crianças e tudo isso que faz chorar e doer) não param de conquistar audiências (quanto mais horríveis, mais espectadores têm) – e o mesmo vale para os livros de testemunhos pungentes do tipo Queimada Viva, que vendeu milhões de exemplares em todo o mundo desde que saiu e desencadeou, de resto, em Portugal, a publicação de muitos livros afins (todos eles com bastante sucesso). Não me admiraria nada que estivesse neste momento a discutir-se nas grandes agências literárias e editoras norte-americanas e inglesas a publicação da história trágica da indiana de 23 anos violada por seis crápulas num autocarro – e morta na sequência desse crime hediondo. E tenho a certeza de que seria best seller para figurar nos primeiros lugares dos Top de vendas em positivamente todos os países, independentemente do grau de repulsa de todos nós pelo sucedido. Teria então o mestre Sigmund razão ao dizer que as pessoas gostam de ver sofrer, mesmo que o palco se tenha transformado em página? É bem possível.L
(blogue HORAS EXTRAORDINÁRIAS, 29 Janeiro 2013)
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