segunda-feira, 29 de setembro de 2014

só isto

Uma semana de silêncio? Ups. Pronto, já o quebrei. É só isto que tenho hoje.

segunda-feira, 22 de setembro de 2014

Na 5ª feira :-)

Esta quinta-feira, na Livraria Barata, lá estaremos, para o lançamento do Coisandês. Conto convosco!

domingo, 21 de setembro de 2014

Cães na tempestade

A insónia empurra-me o sono para o meio-dia
Uma lança de luz espreita da portada azul,
ferindo a penumbra do meu quarto;
Estalam trovões, um arrastar de mesas e cadeiras:
a empregada doméstica dos deuses, limpando o espaço divino,
a generosos baldes de água, lavando o céu e a terra,
trabalho celeste que não me deixa dormir.

E os cães.
Os cães que ladram, cuspindo a sua voz
para rasgar o medo em dois.
O som contínuo, das unhas na porta,
uiva deixa-me entrar!
É o bicho que teima em fugir
para o interior da toca de pedra:
feito para enfrentar lobos na serra
Guardar ovelhas no pasto
Nada quer com trovoadas.

E, no labirinto da minha vigília,
perdida numa vertigem de alamedas
que preenchem a fronteira entre dois mundos desisto.
A minha hora não se cumpre:
Abro a porta e recebo o aroma da terra morna,
O pivete do pelo molhado do animal
que entrou ele, o alívio e o dilúvio
Que misturo com os meus versos
e o ritmo acelerado do belo porte canino
que, arfando, parece dizer-me obrigada
por me salvares da tempestade.
(© VERA DE VILHENA, inéditos)

sábado, 20 de setembro de 2014

Azul-cobalto

© Nanã Sousa Dias
Azul-cobalto

Sobre a mesa o prato, o grão de pimenta
rosa, roçando a fibra
da toalha magenta;
A vidraça ampara a chuva escorrendo
e, no bordado de flores alfazema, acolho
a jarra de vinho - aconchego de um néctar 
de amoras a demorar-me na boca.

O céu saliva um doce lilás,
tecido em hortênsias das ilhas distantes:
é o mar, que me leva e enleva nas ondas de espuma
do sal de Setembro vestindo os rochedos.

Será fome? Será medo?
A dentada da chuva, lambendo a estação
como quem diz adeus.
nos olhos agarro o meu horizonte
de azul cobalto - mar alto no peito 
se bem que, a meu jeito,
sou a beira-mar.

© VERA DE VILHENA, poemas inéditos, Setembro 2014

quarta-feira, 17 de setembro de 2014

Setembro

alguns fados no canto da memória,
um texto sem fim que página a página,
morosamente,
vou dissecando com o meu bisturi

a chuva, os cães, a casa,
a chuva,
janelas que abrem, janelas que fecham,
Tijolo encharcado, quadriculando as horas, os prazos,
cansaço em duras folhas que calco
E vou calculando
o ânimo na mão fechada
À espera do dia de poder ser,
cumprir o trabalho, as contas, alertas
e panos e trapos, secos, molhados,
o sol que espreita em toque-e-fuga
De novo a chuva com boca de água
Vem dizer que o nosso verão morreu.

 O ar cheira a recomeços. Recomeço-me, pois.
Reconheço-me, meço-me
pelos pequenos passos,
pinga aqui, pinga ali, o vento, a folha, a empurrar o cansaço,
a humidade dos dias encravada nas unhas,
a luz da tarde é líquido mel,
setembro avança dourando a uva arrancada
e os corvos já gritam, ralhando comigo,
não percas o fio às palavras, faz-te pássaro
e vem connosco
eu grito de volta que a hora é de ócio e
no hálito morno da minha preguiça
invento uma forma de recomeçar.
(©VERA DE VILHENA, poemas inéditos) - dedico este meu Setembro à Virgínia do Carmo

sábado, 13 de setembro de 2014

Graça Pires

 «Percorro os fonemas como se dançasse,
Envolta numa túnica de água
guarnecida de espelhos.
Sou Ariadne vestida de espanto.
Nos meus dedos cintilam longuíssimos fios
de um novelo de versos e de sonhos
com que me quero salvar.
Já não me lembro de que mitologia saí.
O meu labirinto tem a forma de um pássaro
conivente com a noite.»
(in «Labirintos», 1997, © GRAÇA PIRES, imagem © Sharon Johnstone)

«Caminhamos por entre as árvores
com a boca a saber a menta e a malvas.
Trazemos nas mãos um herbário
de tão fugaz esperança
que nenhuma outra se tece sem desvios
na dobra do peito.
Talvez existam anjos com olhos de musgo
à beira dos abismos por onde se esgueiram 
os dias que nos roubam a eternidade.
Talvez a turbulência verde na borda dos ribeiros
unja de seiva a passagem do tempo.»
(in «A incidência da luz», 2011, © GRAÇA PIRES)

sexta-feira, 12 de setembro de 2014

Leituras

Foi-me feito um desafio que aceitei mas que não tenciono cumprir à risca. É uma missão impossível, além de que nunca tive jeito para as contas. Nós, que amamos os livros, temos uma dificuldade imensa em escolher apenas 10, já se sabe. Aqui vai, por ordem cronológica e sem nenhuma ordem de preferência, alguns livros que marcaram diferentes fases na minha vida:
0 - (eu sei, é batota, têm sorte de eu não começar com números negativos) - Contos de Grimm, Perrault, Hans Christian Andersen, Enid Blytton, Sophia... - tantos! 
0,5 - Condessa de Ségur e outros da Colecção Azul - vários, a despedida da infância...
0,75 - policiais - Simenon, Agatha Christie, Earl Stanley Gardner...
1 - Eça de Queiroz (não consigo escolher apenas um...)
2 - Metamorfose - F. Kafka
3 - Richard Bach - vários
4 - As Três Sereias, Irving Wallace
5 - As Brumas de Avalon, Marion Zimmer Bradley
6 - O Perfume, Patrick Suskind
7 - Fernando Pessoa (não consigo escolher um)
8 - Saramago - vários
9 - Crónica de uma Morte Anunciada+outros, Gabriel García Márquez
9.5 - A Sombra do Vento e O Jogo do Anjo - Carlos Ruiz Zafón
9.9 - Walden ou a vida ns bosques - Thoreaux
10 - José Luís Peixoto - vários
Aaaiii, ficaram de fora M. Yourcenar, Duras, V. Woolf, Joanne Harris, João Aguiar, Tom Sharpe,  David Lodge, Gustave Flaubert, Paris é uma Festa!+ outros, de Ernest Hemingway, Isabel Allende, Rosemunde Pilcher, Jorge Amado, Simone de Beauvoir...ai.

quarta-feira, 10 de setembro de 2014

Caleidoscópios

Oss caleidoscópios sempre exerceram sobre mim um estranho fascínio; talvez por ser uma das muitas formas que eu tinha, na infância, de mergulhar em mundos mágicos sendo tão míope como sempre fui. Ali, de olho mergulhado num dos extremos de um tubo de cartão, provocando os movimentos das peças minúsculas, sentia-me encantada e segura, incapaz de me perder, de apanhar chuva, de ser perseguida por um carneiro mal-humorado ou de esfolar os joelhos.
Este é um caleidoscópio humano, uma campanha de sensibilização a favor da multiplicação das boas ideias: The power of ex. TED. Vale a pena ver em full screen.

segunda-feira, 8 de setembro de 2014

Mentira

polígrafo
Mentira

Tantas camadas sobre cambadas sobre camadas,
Que já não é possível ver a matéria original;
Tantos sorrisos sobre risos sobre sorrisos;
Que já não consigo chorar.
Tanta mentira sobremaneira sobre mentira,
Que me tornei incapaz de dizer a verdade;
Tanta pose sobre posse sobre pose,
Que é impossível gritar, Fui possuído!;
Tanto muro sobre esconjuro sobre muro,
Que já não encontramos a raiz;
Tanto artifício sobre malefício sobre artifício,
Que já não sentimos a nossa pele;
Tanto que fingimos que conseguimos dizer,

Que é impossível a arte articular.

(© Vera de Vilhena, poemas inéditos)

domingo, 7 de setembro de 2014

Língua afiada

«Agora, fechada nesta sala, sinto-me velha e gasta. A minha lâmina já não é o que era. Vêm visitar-me com olhos curiosos e leem o meu magnífico currículo com algum desprezo, como se tivesse sido eu a inventar a lei da gravidade. Que culpa é que eu tenho? Se eu existi e tive uma época de glória, não foi por decisão minha. Apenas dei o meu melhor e tal não podem censurar-me. 
Mau grado a idade avançada, sinto-me bem viva e com muito para dar. Aqui encerrada há tantos anos, nesta inatividade que é de enlouquecer qualquer um, foram-me chegando histórias que me provocam um desejo de regressar ao ativo: só para castigar uns quantos, se é que me entendem. Sei que os tempos mudaram, é certo, e que já não se fazem espetáculos como os de outrora; mas confesso-vos que, se me deixassem, ainda era capaz de fazer perder a cabeça a muitos homens…»
(in «Coisandês, a vida nas coisas», excerto do conto «Língua Afiada», pág.35)

sexta-feira, 5 de setembro de 2014

Irra, até que enfim!

Abriu a página do facebook e libertou o desabafo:
«- IRRA, ATÉ QUE ENFIM! Mais não posso dizer, o decoro não mo permite.»
Logo os comentários choveram:
- Estavas a ver que não! :-)
- Não sei do que falas, mas até que enfim, estou feliz por ti!
Uma mais atrevida perguntou:
- Apareceu-te o periodo que já estava atrasado, foi? Já te estavas a imaginar de fraldas e biberons outra vez, ahahaha!
- Boa! Não há male que sempre dure!
(male????)
-  Fixe! Quem espera sempre alcança!
E mais uma série de provérbios que lhe diziam exactamente aquilo que pretendia ouvir. O facto de ninguém ter a mínima ideia daquilo a que ela se referia com o: Irra até que enfim, não tinha qualquer importância:
- Estou feliz por ti, amiga!
- Deviam-te dinheiro, queres ver? Ai, este país vai de mal a pior!
- Tavas a ver que não!
- Boa!
- Que alívio, hein?
- Vá, conta lá!
Não faziam ideia. É que não faziam a mínima.
O engraçado é que aquela cambada de gente ignorante, relativamente à sua situação, bem intencionada, é certo, lhe havia trazido um estranho consolo.
O facebook era aquilo. Também podia ser aquilo. A solidariedade virtual, de café de esquina, pronta a servir.

quarta-feira, 3 de setembro de 2014

"Coisandês, a vida nas coisas" - lançamento

Meus Caros,

Venho convidar-vos para o lançamento oficial deste meu pequeno livro para leitores dos 10 aos 110 anos de idade. 
Ganhou o prémio Revelação APE/Babel e, ao fim de alguns percalços de publicação, viu este ano a luz do dia, e poderá agora chegar, enfim, às mãos dos seus leitores.
«Coisandês - a vida nas coisas» é isso mesmo: um conjunto de contos em que as coisas-objectos ganham vida e ficamos a conhecer alguns dos seus pensamentos, sonhos, emoções e aventuras.
As ilustrações no interior, a carvão, e de capa inteira, são de Vanessa Bettencourt. O prefácio é de Júlio Isidro.

(clique na imagem para aumentar)

segunda-feira, 1 de setembro de 2014

Morte, livros e figos

Balanço do mês de Agosto:
Churrascadas cá em casa com família e amigos, filho de férias comigo (uma fartura, para tirar a barriga de misérias), um irmão "alentejano" de fim de semana connosco, Golfinho Azul, aulas de voz, 45 primaveras completadas e 15 do Micas (15! Como é que é possível); o candeeiro dos meus sonhos (enfim!), de presente de anos (obrigada Nanã); Hugo e Marta, Marta e Hugo e viva o amor, 47 livros vendidos, um convite para publicar um novo livro (depois revelo) e a notícia triste de duas mortes: uma em Hollywood, outra muito nossa: Robin Williams e Luís Pedro Fonseca. O rever de alguns rostos do passado nas cerimónias fúnebres, festivas, singulares, do Luís Pedro...e luz, muita luz nesta morte inesperada. E a Bix (cadela dos uns tios meus) também nos deixou, foi para o céu dos cães, saltar de nuvem em nuvem, a  tomar banhos de chuva, como cão de água que era.
A leitura irresistível d' O Pecado de Porto Negro, de Norberto Morais e o início de uma nova amizade. O mergulho em Capote, A Sangue Frio, edição de letra minúscula que, ainda assim, lá vou cumprindo, antes de atacar o monte de livros emprestados pela Patrícia Reis, uma amiga para todas as horas.
61 páginas revistas de um total de 302 (Philipp Vitor, um jovem escritor de ficção científica, a ser publicado na Amazon). Um verão a fingir, muito indeciso, num jogo de dá-e-tira; o meu banco BES a passar para "Novo Banco" e do resto dos noticiários nem vale a pena falar; dias de neura, dias de paz; hormonas instáveis, nem sei porquê, o corpo lá saberá mas não me diz ou diz e eu não entendo;  e uma insónia que me devolveu a vontade de escrever, para celebrar a rentrée.
A descoberta da verdade acerca da polinização dos figos. Ainda assim não deixarei de comê-los.
O meu Agosto. Mais coisa menos coisa.
Caro Setembro,
Traz-me um cesto recheado de coisas boas (e figos, já agora), para quem merece e tem o meu coração, como diz a P.

Antecipadamente grata

V