Dois meses depois de ter enviado a sinopse do livro de que mais me orgulho, a editora contacta-me a pedir que envie a obra original. Lá fui eu ao trabalho de corte e costura apressado, com o receio de ter escrito de mais, como é meu hábito. 682.570 caracteres, o que equivale a 361 páginas.
As personagens encolhem-se perante as tesouradas, mostrando-me cara feia. O enredo volumoso cresce como sombra fantasmagórica, pairando sobre o meu corpo, em jeito de ameaça. Encolhendo os ombros, explico-lhe que os leitores têm mais que fazer e lembro-o de que é preciso deitar a palha fora - todo o restolho que não contribua directamente para contar bem a história... tem de ir para a reciclagem.
Ofendido, o grupo de descrições poéticas e filosóficas, diálogos lúdicos, e parágrafos dispensáveis finca os pés em cada folha, recusando-se a abandonar o livro. Suspiro e sorrio, cedendo, por fim: "está bem, está bem, para já, podem ficar: mas só mais um bocadinho!" - como mãe que condescende em adiar a hora de sono dos filhos.
Quase todos os que amam a escrita se debatem com esse problema...escrever muito, sobre tudo, com paixão.
ResponderEliminarOs livros sem essas roupagens e apanágios, ficam nus.
As descrições dão cor, vida...e poesia da alma.
Olha, aí em cima, a Isabel, já disse duma maneira que eu não seria capaz, o que de facto é verdade. Lembra-te do Eça. Ele nunca foi parcimonioso nas descrições, alusões, diálogos...palha serão as palavras que nada dizem. Não é o teu caso, digo-te eu!
ResponderEliminarManda como está, revê só, não deites nada fora!
Break a leg!
Zé
Amigo Zé, não há que ter medo das tesouradas! É como uma mulher cortar o cabelo comprido há muito: de início estranha, depois passa os dedos nas pontas agora bem tratadas, olha o seu novo visual e pensa, afinal, ficou melhor! Estava mesmo a precisar... e o consolo é que os cabelos (neste caso os textos) crescem outra vez! Obrigada pela tua fé sempre fiel e pela comparação queirosiana, sempre lisonjeadora.
ResponderEliminarFascinante como mesmo os 'excessos', que se sabem dispensáveis, têm vida e são pintados com cores e sabores dos indispensáveis. E... claro que se tem de condescender. Fazemo-lo perante tudo o que se ama. Como não pode uma mulher ceder perante 'seres' que deu à luz, depois dum período de gestação prenhe de amor, paixão e crença? Não serão as palavras, também, nossos filhos?
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ResponderEliminarParabéns pelo nascimento de mais um livro, e que o sucesso seja breve e perdure por muitos anos, assim olho o criar de um livro, nascer e no seu caso comunicado ao mundo, como um príncipe, que Deus te guie e as tesouradas sejam de precisão cirúrgica.
ResponderEliminarE por favor avisa quando sair o livro, pois moro no Brasil e poderei ver como conseguir um para mim, desculpe a intimidade, mas beijos e que Deus ilumine a ti e teu filho.
ResponderEliminarQueridos blogueiros, para já, o único prémio foi o de ter terminado um livro. Depois disso, já não depende de mim. O facto da editora me ter pedido o original não garante, infelizmente, que o publiquem. É apenas mais um paço em direcção a uma possível publicação. A concorrência é monstruosa e o mercado muito ingrato. Os dados estão lançados, agora resta-me uma longa espera. A agonia da incógnita. No entanto, fico comovida com demonstrações de carinho como as vossas. Obrigada a todos.
ResponderEliminarErrata: em "paços" ler "passos" A culpa é do leitor "pas(ç)sos! :-)
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