terça-feira, 14 de abril de 2009

Os cafés de Simone de Beauvoir (Paris)

Hoje é o 23º aniversário Da morte de Simone de Beauvoir. Hoje, 14 de Abril, é também o Dia Mundial do Café. A autora passou muitas horas da sua vida nos cafés de Paris, pelo que uma homenagem aos dois faz todo o sentido.

Simone nasceu no quarto da mãe (boulevard du Montparnasse, 103), morada que habitou até aos onze anos. O Café "La Coupolle" ficava mesmo em frente. Já adulta, Simone de Beauvoir corrigiu aí os trabalhos de casa das alunas, escreveu a Sartre, trabalhou no romance "A Convidada" e no segundo volume da sua autobiografia.
O "Café de Flore", na boulevard Saint-Germain, era outro dos lugares onde se sentia bem. e em cujo primeiro andar se refugiava, em plena Segunda Guerra, por não ter aquecimento no quarto de hotel onde estava hospedada. Dizem que chegava cedo, cerca das oito da manhã, para ler e escrever. Era aqui que se encontrava com Sartre e outros intelectuais da época: escritores, actores, artistas.
Claro que não poderia faltar o café "Les Deux Magots", em Saint-Germain-des-Près, onde se encontrou com Bost, seu amante (por sinal, marido da sua amiga Olga...). Aqui pousava, especialmente entre 1945 e 1947, para trabalhar no seu diário, ler e beber. No entanto, era interrompida demasiadas vezes por amigos e desconhecidos, o que tornou o "Les Deux Magots" demasiado indiscreto para o seu gosto.
Simone frequentava o café "La Dôme", em Montparnasse, 108, já desde 1928 e quando conheceu Sartre, no ano seguinte, passou a ser um dos cafés de eleição. Trabalhava sentada nos bancos do fundo, durante o dia, ou no terraço, na companhia de Sartre, à noite.

Não poderia falar-vos de Simone de Beauvoir sem referir o "Hotel La Louisiane", onde viveu entre 1943 e 1946, os anos mais profícuos. Aos 35 anos, publicou o seu primeiro romance, "A Convidada". Jean-Paul Sartre vivia no mesmo andar, ao fundo do corredor. Sim, amigos, amantes, mas cada um com o seu quarto, a sua individualidade. Simone escreveu aqui ensaios e os romances "O Sangue dos Outros", "Todos os Homens São Mortais" e a peça de teatro "Les Bouches Inutiles". Foi nesta época que fundou, com Sartre, a revista "Les Temps Modernes".
Viveu muitos anos em quartos alugados e só aos quarenta teve o seu primeiro apartamento com cozinha... mas sem WC. Os tempos modernos, pelos vistos, eram outros.
Deixo-vos com alguns pensamentos desta grande mulher, retirados da obra "Os Mandarins":

"De dia para dia, acaba por deixar-se incompleta a própria vida."
"Não é cobardia viver como se sente."
SAÚDO-VOS COM UMA BOA CHÁVENA DE CAFÉ, ESSA BENDITA BEBIDA NEGRA E RECONFORTANTE QUE, EM BOA HORA, FOI INVENTADA.
Para mais, espreitem este site:
http://www.simonebeauvoir.kit.net/

3 comentários:

  1. "De dia para dia, acaba por deixar-se incompleta a própria vida."

    Sabes, é o que não gostaria que acontecesse...à minha vida.
    Tento, mas não sei se vou pelo caminho certo...

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  2. Para te responder, transcrevi para aqui um excerto do meu livro "O Pisa-papeis", onde, bem ou mal, tentei ilustrar essa angústia.:
    "O tempo não vale nada e vale tanto. Não chega para nada e chegaria para tanto se o usássemos melhor... e o paradoxo é esse – para o fazermos, temos de o perder – e vamos saltitando pela vida, como crianças, desperdiçando o precioso néctar, sem paciência para reflectir, gastando a vida até esta nos ensinar a poupá-la.
    Porque razão só despertamos quando o Destino nos põe de castigo? Nem sequer se trata da contrição de pecados, mas da gravidade de termos cometido pecados que não eram os nossos. Gastamos tempo da nossa vida em horas e locais que não nos pertencem e a entregar-nos a causas que não nos estavam destinadas – se tivermos a sorte de desembocar na nossa própria vida, experimentamos a vergonha de ter andado a usar a de outro e só nos resta afastá-la com estranheza e embaraço, pedindo desajeitadas desculpas aos que deixámos para trás. É aí que procuramos pelo chão, pelo pó da estrada, a prova, o lugar que nos mostrará o engano no caminho, para podermos oferecer de novo o braço à nossa legítima existência.
    A prova viva que Deus, a existir, terá que ser um incorrigível brincalhão, é a sua maior ironia: quando somámos a sabedoria bastante para apreciar o sol com certa dignidade, o nosso dia anoiteceu."

    Na angústia está a sabedoria. É sinal de que tens consciência de ter de usar bem a vida que tens. Acho eu. Beijos.

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  3. Estou no Hotel La Louisiane neste momento. No quarto 23, o que Simone ocupava seria o 10, no fundo do corredor. Não sabia que Sartre ocuparia o mesmo hotel em quarto separado. Vou acompanhar teu trabalho literário.

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